“Caros populistas, vocês entenderam. A festa acabou”. Assim começa o manifesto original criado por quatro jovens desconhecidos italianos, na faixa dos 30 anos, sem ligação com partidos políticos. O movimento criado por eles, o #6000sardine, se prolifera desde 15 de novembro em dezenas de praças de toda a Itália, com um público que soma centenas de milhares de pessoas contra a extrema direita de Matteo Salvini.
Neste sábado (14), o movimento ganhou as ruas do planeta, com eventos em mais de 24 metrópoles e capitais estrangeiras, no Global Sardine Day.
Eles são em sua maioria jovens, querem mudar o mundo, e parece que andam com o GPS bem antenado: neste sábado (14), os sardinhas, que se consideram “antifascistas”, realizaram um feito digno de grandes lideranças: eles extrapolaram o solo italiano pela primeira vez desde que o movimento eclodiu, há exatamente um mês, “invadindo”, com o Global Sardine Day, cerca de 24 metrópoles estrangeiras como Berlim, Paris, Londres, Dublin, Amsterdam, Madri, Copenhague, São Francisco e Nova York.
Na última sexta-feira (13), durante um show na Itália, até a icônica roqueira Patti Smith convocou os italianos a participarem dos protestos deste sábado.
Nas praças públicas, o canto é sempre o mesmo, da tradicional Praça São Marco, em Veneza, à prefeitura de Copenhague, capital da Dinamarca, onde, sim, os sardinhas estiveram neste sábado: canta-se num coro de milhares de vozes Bella Ciao, música emblemática da Resistência Italiana contra o fascismo de Mussolini na década de 1940, que, revisitada, virou símbolo planetário de resistência e justiça social em 2019, presente em manifestações populares de Beirute a Buenos Aires.
Tudo começou com uma chamada nas redes sociais, cujo resultado não surpreendeu apenas Mattia Santori, Roberto Morotti, Giulia Trappoloni e Andrea Garreffa, os quatro jovens idealizadores do movimento #6000sardine (6000 sardinhas, em português), mas todo o mundo.
Mais de 15 mil pessoas ocuparam uma praça de Bolonha, ali no alto da “bota” italiana, como reação ao líder da extrema-direita, Matteo Salvini, que fazia um pronunciamento em um estádio da cidade.
Trata-se de um verdadeiro fenômeno que, com o nome de um peixe pequeno, que se movimenta em grupos apertados, a sardinha, se espalhou por todo o país e parece encarar sem medo um dos “tubarões” da política italiana.
‘Quarteto Fantástico’
Giulia vem de San Sepolcro, vive em Bolonha há alguns anos, é fisioterapeuta e faz 30 anos em fevereiro de 2020, além de ser a caçula dos “quatro mosqueteiros”. Roberto é engenheiro, e em seu tempo livre realiza oficinas criativas sobre reciclagem de plásticos.
Andrea, que chegou de Savona aos seis anos de idade, é mestre em ciências da comunicação pública e social. Tendo defendido uma tese em comunicação ambiental, agora ele é guia turístico de ciclistas em toda a Europa.
São “jovens de olho nos outros e no mundo”, saúda com alegria a imprensa italiana. Mattia, formado em Ciência Política e Economia, educador no Ultimate Frisbee, criou a associação “La ricotta”: todos os anos ele organiza o torneio de basquete “Gallo da tre” para financiar a reconstrução de playgrounds suburbanos em memória do amigo Davide Galletti, que morreu de leucemia.
Ideia nasceu de um post no Facebook
Como nasceu a invasão das praças inventada pelos “sardinhas”? Via Facebook. Mattia não conseguia dormir naquela noite: “Por que [Matteo] Salvini pode dizer que ele vai tomar [o estado de] Emilia Romagna [cuja capital é Bolonha] e todos nós ficamos em silêncio?”
Foi com um post para os amigos que tudo começou: “vamos nos encontrar”. Na cozinha da casa que os quatro compartilharam durante anos, nasceu a ideia: “Salvini chega ao [estádio de] PalaDozza: há 5.570 lugares. Precisamos ser mais gente do que isso”.
Daí para a multidão instantânea dos #6000sardine na praça de Maggiore, na Bolonha, bastou uma convocação nas redes sociais, que vem respaldada por um manifesto, escrito pelos amigos: “Ainda acreditamos na política e nos políticos com um P maiúsculo”, diz uma de suas frases.
Naquela noite, em Bolonha, eles escolheram o símbolo do movimento: a sardinha, um peixe silencioso, que não “grita como os escandalosos das redes sociais e dos comícios”, mas que traz um símbolo de coletividade. “Juntos e muitos: aqui está a mensagem”.
Depois do lançamento nas redes sociais, os quatro amigos começaram a distribuir panfletos do evento em bares, universidades, cafés, restaurantes e comércios do centro de Bolonha. Foram depois de porta em porta, deram telefonemas, registra em detalhes a imprensa italiana.
Métodos analógicos, que deram resultados concretos: eles esperavam seis mil pessoas na praça, e tinham medo de não conseguirem. Naquela noite, na Praça Maggiore, eles trouxeram o dobro, e bateram Matteo Salvini. “Bem-vindos ao mar aberto”, diz a frase no post do Facebook que criou os #6000sardine.
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